FórumCategoria: Fórum - Perguntas e RespostasPRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE MOEDAS VIRTUAIS – LEI Nº 14.478, DE 21 DE DEZEMBRO DE 2022
Jorge Campos Staff perguntou há 2 anos

Pessoal!

Inicialmente, acho importante que todos conheçam a exposição de motivos desta lei:

JUSTIFICAÇÃO
 
 
As chamadas “moedas virtuais” ganham cada vez mais destaque nas operações financeiras atuais.

Apesar de não haver ainda uma regulamentação nem nacional e nem internacional sobre a matéria, há uma preocupação crescente com os efeitos das transações realizadas por meios destes instrumentos.

O assunto mereceu um relatório especial do Banco Central Europeu (BCE) em outubro de 2012(1), que foi atualizado em fevereiro de 2015(2). Apesar de concluir pela desnecessidade da introdução imediata de uma regulação mais ativa sobre as moedas virtuais, tal relatório aponta um conjunto de riscos que devem ser devidamente monitorados. Colocaremos a seguir um quadro com cada uma das principais conclusões do relatório e um comentário.

Quadro I

 

 

 

Riscos Apontados pelo Relatório sobre Moedas Virtuais do BCEComentário
“Não impõe um risco sobre a estabilidade de preços, conquanto a criação de moeda permaneça em um nível baixo” (tradução livre)3;Como bem ressalvado o efeito das moedas virtuais sobre a estabilidade de preços ainda não traz preocupações enquanto estes mecanismos não crescerem em relação à economia. Assumindo ser inevitável que eles realmente continuem crescendo junto ao incremento do uso da internet, cabe monitorar a partir de que ponto esta premissa deixará de ser verdadeira.
“tendem a ser inerentemente instáveis, mas não têm o condão de comprometer a estabilidade financeira do país dada a suaMais uma vez o Relatório do BCE faz a devida ressalva de que a desnecessidade de regulação imediata depende da (ainda) baixa amplitude de adoção dessas moedas
conexão limitada com a economia real, seu baixo volumevirtuais. Com o crescimento da internet impulsionando as moedas virtuais haverá
negociado e a falta de aceitação tão ampla entre os usuários” (tradução livre)4um natural incremento de pontos de conexão com a economia real, podendo passar a ameaçar a estabilidade financeira. De qualquer forma, o Relatório indica que tais esquemas são inerentemente instáveis, com elevada volatilidade da sua relação de troca com a moeda local.
“não é regulado no presente momento e não é supervisionado ou fiscalizado de perto por qualquer autoridade pública ainda que a participação nesses esquemas exponha os usuários a riscos de crédito, liquidez, operacionais e legais” (tradução livre)5Aqui a preocupação é menos sistêmica e mais de direito do consumidor. Os usuários desses mecanismos estão inadvertidamente expostos a riscos financeiros significativos e sem proteção legal alguma.
“podem representar um desafio às autoridades públicas, dada a incerteza legal por trás destes esquemas que podem ser utilizados por criminosos, fraudadores e pessoas que lavam dinheiro para realizar suas operações ilegais” (tradução livre) 6As moedas virtuais facilitam atividades criminosas, especialmente lavagem de dinheiro.
“podem ter um efeito negativo sobre a reputação dos Bancos Centrais, assumindo que o uso de tais sistemas cresce consideravelmente e que no caso de um incidente atrair a cobertura da imprensa, o público pode perceber o incidente como sendo causado, em parte, pelo fato de o Banco Central não estar fazendo seu trabalho direito” (tradução livre)7.Um esquema que pode ser entendido como uma “pirâmide” que acaba desmoronando pode ser interpretado como uma “barbeiragem” do Banco Central, minando a sua credibilidade.
“recaem sob a responsabilidade dos Bancos Centrais na medida que o seu funcionamento tem características compartilhadas com os sistemas de pagamento, o que implica a necessidade de exame de pelo menos alguns dos seus desenvolvimentos e a provisão de uma avaliação inicial” (tradução livre)8Constitui um reconhecimento de que as moedas virtuais constituem sistemas de pagamento e como tal devem ser monitorados de perto.

 

Sobressai-se nesta análise das moedas virtuais o que é considerado o maior caso de “sucesso” que é o Bitcoin. Conforme o relatório do ECB de 2012:

Desenhado e implementado pelo programador japonês Satoshi Nakamoto em 2009, o esquema é baseado em uma rede peer-to peer similar ao Bit Torrent, o famoso protocolo de compartilhamento de arquivos como filmes, jogos e música na internet. O Bitcoin opera globalmente e pode ser usado como moeda para todos os tipos de transação (para ambos bens, e serviços virtuais e reais), competindo portanto com as moedas oficiais como o euro e o dólar.  embora o Bitcoin seja um esquema de

moeda virtual, possui algumas inovações que a tornam mais similar à moeda convencional” (tradução livre)9.

 

O mais importante para nós, no entanto, são os riscos potenciais apontados no relatório para o Bitcoin:

De tempos em tempos, o Bitcoin é cercado por controvérsias. Algumas vezes ressalta-se o seu potencial para se tornar uma alternativa monetária ao tráfico de drogas e lavagem de dinheiro, como resultado do elevado grau de anonimato. Em outras ocasiões, os usuários têm

reclamado ter sofrido um roubo substancial de Bitcoins através de um “cavalo de troia” que ganhou acesso ao seu computador. A Fundação Fronteira Eletrônica, que é uma organização que busca defender a liberdade no mundo digital, decidiu não mais aceitar doações em Bitcoins. Entre as razões dadas, eles consideraram “que a Bitcoin gera preocupações legais ainda não testadas relacionadas às lei de ativos financeiros, com o “Stamp Payment Act” (legislação que proíbe qualquer pagamento abaixo em moeda, nota ou cheque abaixo de $1), de evasão de tributos, de proteção do consumidor e lavagem de dinheiro, entre outros” (tradução livre)”10

 

O Relatório do BCE também possui um box específico (box 1) para os programas de milhagem. O efeito de tais programas, enquanto uma “moeda paralela”, não pode ser subestimado. O Relatório cita matéria do “The Economist” de 2005 que mostra que tais programas, já naquela época, atingiam valores significativos, inclusive ultrapassando a quantidade de dólares em circulação. O Relatório inclui os programas de milhagem como um tipo específico de “moeda virtual”.

Em certa medida acreditamos que tanto o Banco Central como o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e os órgãos do consumidor já tem competência para fiscalizar e regular moedas virtuais. No entanto, entendemos que as legislações que conferem tais atribuições podem ser mais transparentes em relação a tais atribuições, o que evita desnecessários questionamentos judiciais.

Sendo assim, endereçamos no projeto de lei proposto três questões relacionadas às moedas virtuais, uma em cada artigo: i) regulação prudencial pelo Banco Central, ii) lavagem de dinheiro e outras atividades ilegais e iii) defesa do consumidor. Deixamos claro no art. 1º que os “arranjos de pagamento” citados no inciso I do art. 9º da Lei 12.865, de 09 de outubro de 2013 inclui “aqueles baseados em moedas virtuais e programas de milhagens aéreas”. Ademais, deixamos claro no art. 2º que as operações que envolvem moedas virtuais estão incluídas na fiscalização do COAF: Por fim, não deixamos margem a dúvida de que a legislação de defesa do consumidor se aplica ao mundo das moedas virtuais no art. 3º.

Contamos com o apoio dos nobres pares para a aprovação desta importante medida para reduzir os riscos das moedas virtuais contra a estabilidade financeira da economia, diminuir a possibilidade delas financiarem atividades ilegais além de proteger o consumidor contra eventuais abusos.

 

 

Sala das Sessões, em         de                       de 2015.

 

 

 

 

Deputado AUREO

 

LEI Nº 14.478, DE 21 DE DEZEMBRO DE 2022

 

Vigência Dispõe sobre diretrizes a serem observadas na prestação de serviços de ativos virtuais e na regulamentação das prestadoras de serviços de ativos virtuais; altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), para prever o crime de fraude com a utilização de ativos virtuais, valores mobiliários ou ativos financeiros; e altera a Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986, que define crimes contra o sistema financeiro nacional, e a Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998, que dispõe sobre lavagem de dinheiro, para incluir as prestadoras de serviços de ativos virtuais no rol de suas disposições.

 

 

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre diretrizes a serem observadas na prestação de serviços de ativos virtuais e na regulamentação das prestadoras de serviços de ativos virtuais.

Parágrafo único. O disposto nesta Lei não se aplica aos ativos representativos de valores mobiliários sujeitos ao regime da Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976, e não altera nenhuma competência da Comissão de Valores Mobiliários.

Art. 2º As prestadoras de serviços de ativos virtuais somente poderão funcionar no País mediante prévia autorização de órgão ou entidade da Administração Pública federal.

Parágrafo único. Ato do órgão ou da entidade da Administração Pública federal a que se refere o caput estabelecerá as hipóteses e os parâmetros em que a autorização de que trata o caput deste artigo poderá ser concedida mediante procedimento simplificado.

Art. 3º Para os efeitos desta Lei, considera-se ativo virtual a representação digital de valor que pode ser negociada ou transferida por meios eletrônicos e utilizada para realização de pagamentos ou com propósito de investimento, não incluídos:

I – moeda nacional e moedas estrangeiras;

II – moeda eletrônica, nos termos da Lei nº 12.865, de 9 de outubro de 2013;

III – instrumentos que provejam ao seu titular acesso a produtos ou serviços especificados ou a benefício proveniente desses produtos ou serviços, a exemplo de pontos e recompensas de programas de fidelidade; e

IV – representações de ativos cuja emissão, escrituração, negociação ou liquidação esteja prevista em lei ou regulamento, a exemplo de valores mobiliários e de ativos financeiros.

Parágrafo único. Competirá a órgão ou entidade da Administração Pública federal definido em ato do Poder Executivo estabelecer quais serão os ativos financeiros regulados, para fins desta Lei.

Art. 4º A prestação de serviço de ativos virtuais deve observar as seguintes diretrizes, segundo parâmetros a serem estabelecidos pelo órgão ou pela entidade da Administração Pública federal definido em ato do Poder Executivo:

I – livre iniciativa e livre concorrência;

II – boas práticas de governança, transparência nas operações e abordagem baseada em riscos;

III – segurança da informação e proteção de dados pessoais;

IV – proteção e defesa de consumidores e usuários;

V – proteção à poupança popular;

VI – solidez e eficiência das operações; e

VII – prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo e da proliferação de armas de destruição em massa, em alinhamento com os padrões internacionais.

Art. 5º Considera-se prestadora de serviços de ativos virtuais a pessoa jurídica que executa, em nome de terceiros, pelo menos um dos serviços de ativos virtuais, entendidos como:

I – troca entre ativos virtuais e moeda nacional ou moeda estrangeira;

II – troca entre um ou mais ativos virtuais;

III – transferência de ativos virtuais;

IV – custódia ou administração de ativos virtuais ou de instrumentos que possibilitem controle sobre ativos virtuais; ou

V – participação em serviços financeiros e prestação de serviços relacionados à oferta por um emissor ou venda de ativos virtuais.

Parágrafo único. O órgão ou a entidade da Administração Pública federal indicado em ato do Poder Executivo poderá autorizar a realização de outros serviços que estejam, direta ou indiretamente, relacionados à atividade da prestadora de serviços de ativos virtuais de que trata o caput deste artigo.

Art. 6º Ato do Poder Executivo atribuirá a um ou mais órgãos ou entidades da Administração Pública federal a disciplina do funcionamento e a supervisão da prestadora de serviços de ativos virtuais.

Art. 7º Compete ao órgão ou à entidade reguladora indicada em ato do Poder Executivo Federal:

I – autorizar funcionamento, transferência de controle, fusão, cisão e incorporação da prestadora de serviços de ativos virtuais;

II – estabelecer condições para o exercício de cargos em órgãos estatutários e contratuais em prestadora de serviços de ativos virtuais e autorizar a posse e o exercício de pessoas para cargos de administração;

III – supervisionar a prestadora de serviços de ativos virtuais e aplicar as disposições da Lei nº 13.506, de 13 de novembro de 2017, em caso de descumprimento desta Lei ou de sua regulamentação;

IV – cancelar, de ofício ou a pedido, as autorizações de que tratam os incisos I e II deste caput; e

V – dispor sobre as hipóteses em que as atividades ou operações de que trata o art. 5º desta Lei serão incluídas no mercado de câmbio ou em que deverão submeter-se à regulamentação de capitais brasileiros no exterior e capitais estrangeiros no País.

Parágrafo único. O órgão ou a entidade da Administração Pública federal de que trata o caput definirá as hipóteses que poderão provocar o cancelamento previsto no inciso IV do caput deste artigo e o respectivo procedimento.

Art. 8º As instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil poderão prestar exclusivamente o serviço de ativos virtuais ou cumulá-lo com outras atividades, na forma da regulamentação a ser editada por órgão ou entidade da Administração Pública federal indicada em ato do Poder Executivo federal.

Art. 9º O órgão ou a entidade da Administração Pública federal de que trata o caput do art. 2º desta Lei estabelecerá condições e prazos, não inferiores a 6 (seis) meses, para adequação das prestadoras de serviços de ativos virtuais que estiverem em atividade às disposições desta Lei e às normas por ele estabelecidas.

Art. 10. O Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar acrescido do seguinte art. 171-A:

“Fraude com a utilização de ativos virtuais, valores mobiliários ou ativos financeiros

Art. 171-A. Organizar, gerir, ofertar ou distribuir carteiras ou intermediar operações que envolvam ativos virtuais, valores mobiliários ou quaisquer ativos financeiros com o fim de obter vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento.

Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.”

Art. 11. O parágrafo único do art. 1º da Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986, passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 1º ………………………………………………………………………………………………………….

Parágrafo único. ……………………………………………………………………………………………..

………………………………………………………………………………………………………………………………..

I-A – a pessoa jurídica que ofereça serviços referentes a operações com ativos virtuais, inclusive intermediação, negociação ou custódia;

………………………………………………………………………………………………………………………” (NR)

Art. 12. A Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998, passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 1º ………………………………………………………………………………………………………….

………………………………………………………………………………………………………………………………..

  • 4º A pena será aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) se os crimes definidos nesta Lei forem cometidos de forma reiterada, por intermédio de organização criminosa ou por meio da utilização de ativo virtual.

……………………………………………………………………………………………………………………….” (NR)

“Art. 9º ………………………………………………………………………………………………………….

………………………………………………………………………………………………………………………………..

Parágrafo único. ……………………………………………………………………………………………..

………………………………………………………………………………………………………………………………..

XIX – as prestadoras de serviços de ativos virtuais.” (NR)

“Art. 10. …………………………………………………………………………………………………………

………………………………………………………………………………………………………………………………..

II – manterão registro de toda transação em moeda nacional ou estrangeira, títulos e valores mobiliários, títulos de crédito, metais, ativos virtuais, ou qualquer ativo passível de ser convertido em dinheiro, que ultrapassar limite fixado pela autoridade competente e nos termos de instruções por esta expedidas;

……………………………………………………………………………………………………………………….” (NR)

“Art. 12-A. Ato do Poder Executivo federal regulamentará a disciplina e o funcionamento do Cadastro Nacional de Pessoas Expostas Politicamente (CNPEP), disponibilizado pelo Portal da Transparência.

  • 1º Os órgãos e as entidades de quaisquer Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios deverão encaminhar ao gestor CNPEP, na forma e na periodicidade definidas no regulamento de que trata ocaputdeste artigo, informações atualizadas sobre seus integrantes ou ex-integrantes classificados como pessoas expostas politicamente (PEPs) na legislação e regulação vigentes.
  • 2º As pessoas referidas no art. 9º desta Lei incluirão consulta ao CNPEP entre seus procedimentos para cumprimento das obrigações previstas nos arts. 10 e 11 desta Lei, sem prejuízo de outras diligências exigidas na forma da legislação.
  • 3º O órgão gestor do CNPEP indicará em transparência ativa, pela internet, órgãos e entidades que deixem de cumprir a obrigação prevista no § 1º deste artigo.”

Art. 13. Aplicam-se às operações conduzidas no mercado de ativos virtuais, no que couber, as disposições da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor).

Art. 14. Esta Lei entra em vigor após decorridos 180 (cento e oitenta) dias de sua publicação oficial.

Brasília, 21 de dezembro de 2022; 201o da Independência e 134o da República.

JAIR MESSIAS BOLSONARO

Marcelo Pacheco dos Guaranys

Wagner de Campos Rosário

Este texto não substitui o publicado no DOU de 22.12.2022