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Diário Oficial da União
Publicado em: 25/03/2025 | Edição: 57 | Seção: 1 | Página: 46
Órgão: Ministério da Fazenda/Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil
INStrução normativa rfb Nº 2.260, DE 24 DE março DE 2025
Torna nulo o Ato Declaratório Executivo Cofis nº 75, de 17 de outubro de 2016, e o Ato Declaratório Executivo Cofis nº 94, de 12 de dezembro de 2016, e dá publicidade da suspensão da eficácia da Instrução Normativa RFB nº 2.251, de 13 de fevereiro de 2025.
O SECRETÁRIO ESPECIAL DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL, no uso da atribuição que lhe confere o art. 350, caput, inciso III, do Regimento Interno da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, aprovado pela Portaria ME nº 284, de 27 de julho de 2020, e tendo em vista a determinação proferida pelo Tribunal de Contas da União – TCU no Acórdão nº 2.144/2023 TCU – Plenário, de 18 de outubro de 2023, a decisão monocrática do TCU, de 14 de março de 2025, em seu item 28, alínea b, proferida nos Autos do processo TC 003.526/2025-9, confirmada no Acórdão nº 607/2025 – TCU – Plenário, na sessão ordinária de 19 de março de 2025, e o Parecer n.00011/2025/DEAEX/CGU/AGU, de 21 de março de 2025, resolve:
Art. 1º Torna sem efeito a revogação promovida pela Instrução Normativa RFB nº 2.251, de 13 de fevereiro de 2025, dos seguintes atos relacionados em seu Anexo Único:
I – Ato Declaratório Executivo Cofis nº 75, de 17 de outubro de 2016; e
II – Ato Declaratório Executivo Cofis nº 94, de 12 de dezembro de 2016.
Art. 2º Tornam-se nulos os atos mencionados nos incisos I e II do art. 1º.
Art. 3º Encontra-se suspensa a eficácia da Instrução Normativa RFB nº 2.251, de 13 de fevereiro de 2025, conforme decisão do Tribunal de Contas da União – TCU.
Art. 4º Esta Instrução Normativa entra em vigor na data de sua publicação no Diário Oficial da União.
ROBINSON SAKIYAMA BARREIRINHAS
GRUPO II – CLASSE VII – Plenário
TC 003.526/2025-9
Natureza: Denúncia.
Entidade: Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB).
Interessada: Identidade preservada (art. 55, caput, da Lei 8.443/1992).
Representação legal: Rodolpho Heck Ramazzini (OAB/SP217.537).
SUMÁRIO: DENÚNCIA. DESLIGAMENTO DO SISTEMA DE CONTROLE DE PRODUÇÃO DE BEBIDAS (SICOBE) POR FORÇA DE ATO ADMINISTRATIVO DA SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL. AFRONTA AO ART. 35 DA LEI 13.097/2015. DETERMINAÇÃO PARA RELIGAMENTO DO SISTEMA. NÃO ADOÇÃO DE MEDIDAS CONCRETAS PARA DAR CUMPRIMENTO ÀS DECISÕES DO TCU. PRÁTICA DE ATOS CONTRÁRIOS AO DETERMINADO NO ACÓRDÃO 2.144/2023-TCU-PLENÁRIO. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DA AUTORIDADE DAS DELIBERAÇÕES DESTA CORTE. PRESENÇA DE FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA. AUSÊNCIA DE PERIGO DA DEMORA REVERSO. REFERENDO DE MEDIDA CAUTELAR. OITIVAS. RESTABELECIMENTO DO PRAZO ORIGINALMENTE FIXADO PARA DAR CUMPRIMENTO AO ACÓRDÃO 2.144/2023-TCU-PLENÁRIO.
RELATÓRIO
Adoto como relatório o teor do despacho de 14/03/2025 (peça 10), por meio do qual determinei, cautelarmente, a suspensão dos efeitos da Instrução Normativa RFB 2.251, de 13 de fevereiro de 2025,
publicada no Diário Oficial da União de 14 de fevereiro de 2025, à exceção da revogação do Ato Declaratório Executivo Cofis 75, de 17 de outubro de 2016, e do Ato Declaratório Executivo Cofis 94, de 12 de
dezembro de 2016, repristinando-se os efeitos dos demais atos:
“Cuidam os autos de denúncia, com pedido de liminar, a respeito de possíveis irregularidades ocorridas na Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB), relacionadas à edição da Instrução
Normativa RFB 2.251/2025, que resultou na revogação de atos normativos editados por aquela Secretaria e relacionados ao controle de bebidas no país, em afronta ao Acórdão 1.633/2024-TCU-Plenário,
proferido nos autos do TC 047.527/2020-0.
- Previamente à análise da medida cautelar pleiteada, cabe uma breve recapitulação das decisões sobre o tema proferidas no TC 047.527/2020-0.
-II-
- O precitado Acórdão 1.633/2024-TCU-Plenário confirmou decisão anterior desta Corte, carreada no Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário, cujo teor reproduzo:
- Acórdão:
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de denúncia sobre indícios de irregularidades relacionadas ao desligamento do Sistema de Controle de Produção de Bebidas (Sicobe) pela
Para verificar as assinaturas, acesse http://www.tcu.gov.br/autenticidade e informe o código 77739925.
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 003.526/2025-9
Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, em desacordo aos preceitos do art. 35 da Lei 13.097/2015, ACORDAM os ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão
do Plenário, diante das razões expostas pelo relator, em:
9.1. nos termos dos arts. 234 e 235 do Regimento Interno, conhecer da denúncia para, no mérito, considerá-la procedente;
9.2. nos termos do art. 250, inciso II, do Regimento Interno, determinar à Secretaria Especial da Receita Federal que:
9.2.1. no prazo de 15 (quinze) dias, adote as providências necessárias à anulação do Ato Declaratório Executivo 75/2016 e do Ato Declaratório Executivo 94/2016, por
afrontarem o art. 35, caput e parágrafo único, da Lei 13.097/2015;
9.2.2. no prazo de 60 (sessenta) dias, em conjunto com a Casa da Moeda do Brasil, adote as providências necessárias ao restabelecimento da utilização do Sicobe em todas
as pessoas jurídicas obrigadas pela Lei 13.097/2015 e legislação correlata, em estrita observância ao art. 1º da Instrução Normativa RFB 869/2008.
9.3. orientar à unidade técnica do TCU que monitore a presente decisão em autos apartados, nos termos dos arts. 243 e 250, inciso III, in fine, do Regimento Interno;
9.4. dar ciência desta decisão à denunciante, à Secretaria Especial da Receita Federal e à Casa da Moeda do Brasil;
9.5. levantar o sigilo que recai sobre os autos, à exceção das peças que contiverem informações pessoais a permitir a identificação do denunciante, nos termos dos arts. 104, §
1º, e 108, parágrafo único, ambos da Resolução-TCU 259/2014; e
9.6. arquivar o presente processo, com fundamento no art. 169, inciso III, do Regimento Interno. [grifo adicionado]
- No âmbito do TC 047.527/2020-0, do qual fui relator, este Tribunal considerou ilegal a edição, pela RFB, dos Atos Declaratórios Executivos (ADE) 75/2016 e 94/2016, porquanto atentavamcontra o art. 35 da Lei 13.097/2015, nos termos do voto que proferi no Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário:
- A evolução normativa acima delineada evidencia uma cadeia de atos legais e infralegais, que se complementam. No plano legal, ainda vigentes, há a MP 2.185-35/2001 e a Lei
13.097/2015. Subordinados a elas e de relevo para o caso ora analisado, h7á o Decreto 8.442/2015, a IN 869/2008, o ADE 75/2016 e o ADE 94/2016.
- Entendo que o ADE 75/2016 deve ser analisado de forma associada ao ADE 94/2016, muito embora este último não tenha sido atacado pela denúncia. Isso porque ambos os atos,
conjuntamente, promoveram, de forma genérica, abstrata e impessoal, desobrigação de utilização do Sicobe, sem que definissem, em substituição, a utilização de qualquer outro
sistema contador de produção, conforme exigido pelo art. 35 da Lei 13.097/2015.
[…]
- No caso em tela, considero que a Secretaria Especial da Receita Federal, ao editar os ADEs 75/2016 e 94/2016, andou em sentido absolutamente oposto ao que determina o
parágrafo único do art. 35 da Lei 13.097/2015. Embora lhe coubesse definir forma, limites, condições e prazos que assegurassem o cumprimento da lei por parte dos
estabelecimentos industriais, o órgão, por ato próprio, esvaziou completamente o comando legal, abolindo indiscriminadamente o uso do único sistema então disponível e operante, sem
determinar a utilização de qualquer outro.
- Ressalto que, enquanto vigente o art. 35 da Lei 13.097/2015, deverá a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil dar-lhe pleno cumprimento, adotando providências para que as pessoas jurídicas destinatárias da norma instalem equipamentos contadores de produção os quais possibilitem, ainda, a identificação do tipo de produto, de embalagem e sua marca comercial, nos exatos termos da legislação aplicável.
- Assim, alinho-me, em parte, ao douto parquet, porquanto entendo desarrazoado e afrontoso ao princípio da legalidade qualquer entendimento de que a obrigatoriedade insculpida no art. 35 da Lei 13.097/2015 possa ser genérica e abstratamente afastada por mero ato infralegal, seja de que natureza for, tal como ocorreu com a edição dos ADEs 75/2016 e 94/2016 pela RFB. [grifo adicionado]
- O Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário foi objeto de pedido de reexame, de relatoria do ministro Vital do Rego. Naquela oportunidade, ao deliberar pelo não provimento do recurso, assim se manifestou Sua
Excelência:
- Além disso, a recorrente lança mão do princípio da autotutela e da discricionariedade administrativa, tendo em vista que, por ter a RFB definido a obrigatoriedade de determinados
estabelecimentos utilizarem o Sicobe e ter estabelecido as atribuições da Casa da Moeda como responsável pela operacionalização desse sistema, mediante norma infralegal (IN
869/2008), também poderia, da mesma forma, suspender essas previsões, por questões de conveniência e de mérito administrativo, como foi o caso dos ADEs 75 e 94/2016.
- Se, por um lado, é verdade que a RFB, ao dispor sobre o Sicobe, está a desempenhar suas atividades precípuas relacionadas à regulamentação de obrigações acessórias (art. 16 da Lei
9.779/1999) e de modo discricionário, como defende, também não há dúvidas de que, no caso específico sob escrutínio, a própria Lei 13.097/2015 prevê um segundo ator
institucional para dar pleno cumprimento às exigências de controle de produção de bebidas.
Há, portanto, limites de ordem estritamente legal a balizarem os critérios de conveniência e oportunidade suscitados pela denunciada.
- É que, como bem colocado no pronunciamento da unidade (peça 111), o caput do art. 35 da Lei nº 13.097/2015, ao instituir a obrigação de instalar sistemas de controle de produção
para as indústrias de bebidas, fez expressa referência à aplicação, no que couber, das disposições contidas nos arts. 27 a 30 da Lei nº 11.488/2007.
- Assim, a responsabilidade direta e explícita da Casa da Moeda do Brasil nesse arranjo legal de competências é extraída do art. 28 da Lei nº 11.488/2007:
[…]
- Verifica-se, portanto, expressa disposição legal sobre a participação obrigatória da Casa da Moeda do Brasil no processo, definida soberanamente pelo Congresso
Nacional, de modo que não pode a RFB, mediante norma infralegal, alijar a empresa pública de maneira unilateral, como o fez quando descontinuou a utilização do Sicobe por
meio dos ADEs questionados na presente denúncia.
- Não se desconhecem os problemas e fragilidades apontados pela RFB quanto à utilização do Sicobe, que devem ser equacionados pelos meios próprios. Contudo, conforme
demonstrado, as atribuições da Casa da Moeda advêm de vontade legislativa, ou seja, tratase de critério objetivo de legalidade, cuja inobservância, no presente caso concreto, não pode
ser superada pelas alegações trazidas em pedido de reexame.
[…]
- Nesses contornos, como visto, a abolição da utilização do Sicobe pelas ADEs 75 e 94/2016 teve como consequência imediata a ilegal subtração de responsabilidades da
Casa da Moeda do Brasil. Daí decorre que as determinações deste Tribunal proferidas pelo Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário encontram-se plenamente amparadas pelas
questões de fato e de direito que delineiam o caso. [grifo adicionado]
- O voto do relator – pelo não provimento do recurso – foi encampado pela Corte, dando origem ao Acórdão 1.633/2024-TCU-Plenário. Esse último, por sua vez, foi objeto de embargos de declaração, posteriormente não acolhidos, conforme Acórdão 2.615/2024-TCU-Plenário. As determinações do Acórdão Para verificar as assinaturas, acesse http://www.tcu.gov.br/autenticidade e informe o código 77739925. 2.144/2023-TCU-Plenário, então, transitaram em julgado em 31/1/2025, encontrando-se, até o presente momento, integralmente válidas.
- O referido aresto é objeto de monitoramento no âmbito do TC 001.021/2025-7. Naqueles autos (peça 26), a União solicitou prorrogação de prazo apenas a fim de dar cumprimento ao item 9.2.1 do Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário. Em atendimento, por meio do Acórdão nº 374/2025-TCU-Plenário, concederam-se 30 dias de prorrogação à União para dar cumprimento à integralidade das deliberações veiculadas no Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário.
- Logo, tomando-se por base a data do trânsito em julgando e a prorrogação concedida, o prazo para a RFB proceder à anulação dos ADEs 75/2016 e 94/2016 (item 9.2.1 do Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário) foi dilatado até 19/3/2025, enquanto o prazo para a RFB e a Casa da Moeda do Brasil (CMB) religarem o Sicobe, até 5/5/2025.
-III-
- Na presente denúncia, relata-se que a RFB, por meio da edição da IN 2.251/2025, publicada no Diário Oficial da União de 14/2/2025, estaria adotando medidas procrastinatórias a fim de não dar cumprimento às determinações do Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário. São os termos da referida IN:
O SECRETÁRIO ESPECIAL DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL, no uso da atribuição que lhe confere o art. 350, caput, inciso III, do Regimento Interno da Secretaria Especial da
Receita Federal do Brasil, aprovado pela Portaria ME nº 284, de 27 de julho de 2020, e tendo em vista o disposto no art. 35 da Lei nº 13.097, de 19 de janeiro de 2015, no art. 36, § 1º,
inciso II, da Medida Provisória nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, e no Acórdão nº 2.144/2023-TCU-Plenário, sessão de 18 de outubro de 2023, resolve:
Art. 1º Esta Instrução Normativa revoga os atos que dispõem sobre a instalação e utilização de equipamentos contadores de produção nos estabelecimentos industriais de que trata o art.
35 da Lei nº 13.097, de 19 de janeiro de 2015, e estabelece prazo para a edição de atos atualizados sobre a matéria.
Art. 2º Ficam revogados os atos relacionados no Anexo Único.
Art. 3º Os atos normativos que estabelecerão a forma, os limites, as condições e os prazos referentes à obrigatoriedade de que trata o art. 35, caput, da Lei nº 13.097, de 19 de janeiro
de 2015, sem prejuízo do disposto no art. 36 da Medida Provisória nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, serão publicados no prazo de trinta dias, contados da data de publicação
desta Instrução Normativa.
Art. 4º Esta Instrução Normativa entra em vigor na data de sua publicação no Diário Oficial da União.
- Por meio da IN 2.251/2025, a RFB procedeu à revogação de 244 atos, entre instruções normativas a atos declaratórios, fulminando todo o arcabouço normativo infralegal que dava concretude e efetividade ao art. 35 da Lei 13.079/2015. Ademais, em vez de proceder à anulação dos ADEs 75/2016 e 94/2016, tal como determinado pelo item 9.2.1 do Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário, a RFB optou por inseri-los no rol de atos revogados pela IN 2.251/2025.
- A diferença entre revogação e anulação é uma das mais básicas lições de direito administrativo.
Enquanto a revogação tem por objeto atos que se tornaram inconvenientes e inoportunos, segundo o juízo de discricionariedade do administrador público, a anulação traduz o poder-dever de autotutela exercido pelo gestor, que deve fulminar atos contrários ao ordenamento jurídico. Nessa exegese, o ato que deve ser anulado jamais poderá ser revogado. Tais diretrizes encontram-se plasmadas na Súmula 473 do Supremo Tribunal Federal e no art. 53 da Lei 9.784/1999, a seguir transcrito:
Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos. [grifo adicionado]
- A simples revogação dos ADEs 75/2016 e 94/2016, portanto, não satisfaz à determinação contida no item 9.2.1 do Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário. Pelo contrário: a retirada de tais atos do mundo jurídico pela simples revogação conduz à própria ineficácia da determinação desta Corte, porquanto não haverá como a RFB proceder à anulação de ato por ela já revogado.
- Quanto à regularidade da revogação dos demais atos listados na IN 2.251/2025, uma análise mais aprofundada deve ser feita.
- Sobre o desligamento/religamento do Sicobe, além destes autos e dos TCs 047.527/2020-0 e001.021/2025-7, tramita nesta Corte o TC 004.029/2025-9, cujo objeto é nova denúncia contra atos da RFB que se afastariam das determinações do Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário. Como fundamento principal dessa nova denúncia, é apresentada ata de reunião convocada pelo Ministério da Fazenda e realizada em 19/2/2025 (peça 7, fls. 24/25 daqueles autos). Participaram do referido encontro representantes da Secretaria-Executiva do Ministério da Fazenda, da RFB, da CMB e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
- Transcrevo excertos relevantes da referida ata:
Às 18:50 do dia 19 de fevereiro de 2025 realizou-se reunião na sala Cambuí do edifício sedo do Ministério da Fazenda, convocada pelo Secretário Executivo do Ministério da Fazenda,
para tratar de assuntos relativos à Casa da Moeda do Brasil (CMB).
[…]
- Assuntos Abordados. 2.1. Modelo do Sistema de Controle de Produção de Bebidas (Sicobe) e necessidade de se trabalhar de forma conjunta para melhoria do sistema.
Ministério da Fazenda, em cumprimento à decisão do TCU está criando um novo modelo do Sicobe e deverá ser feita uma comunicação conjunta ao TCU acerca das providências que
estão sendo adotadas. TCU determinou prazos para a revogação de atos relacionados ao Sicobe. PGFN indicou que em meados de março há o prazo de religação do Sicobe, de modo
que será necessário a ida em conjunto ao TCU para se informar que o novo modelo está sendo desenvolvido.
[…]
Da parte do Ministério da Fazenda, os próximos passos seriam:
i) publicação da nova IN da Receita, baseada nos encaminhamentos do Relatório do GT, que recomendam tecnologia de códigos digitais, e a participação da CMB nos limites legais;
ii) solicitação, em conjunto com a CMB, a AGU, para peticionamento, no TCU, informando sobre a necessidade de especificação e implementação do modelo de controle e estimativa de prazo necessário;
iii) Diálogo com Estados e Municípios para cooperação e eventualmente integração em virtude da reforma tributária;
iv) Publicação dos atos complementares de especificação do modelo e dos requisitos para credenciamento das empresas prestadoras dos serviços;
v) Credenciamento das empresas interessadas na prestação do serviço do serviço;
vi) Implementação do SICOBE no novo modelo.
[…]
A PGFN indicou que a estratégia de ação deve ser a apresentação imediata – antes de 16 de março – de um esqueleto do novo modelo ao TCU, tendo em vista o vácuo com a revogação
do sistema normativo do antigo Sicobe e solicitando prazo adicional para as etapas seguintes.
[…]
O Presidente da CMB informou da existência de um contrato vigente de 2018 a 2028, mesmo que sem utilização desde 2018, data de sua assinatura. O Secretário-Executivo do
MF sugeriu que a CMB estudasse providências para eventual denúncia do referido contrato a fim de que a nova sistemática do Sicobe seja implementada de forma menos onerosa para o
setor público, solicitando que informações sobre o procedimento seja apresentadas ao longo da próxima semana e que, ainda na data de hoje, fosse disponibilizada cópia do contrato em
vigor para a PGFN. [sic]
- Os fragmentos da ata da precitada reunião evidenciam que a RFB e a CMB, além dos demais órgãos participantes, em momento algum debateram medidas para dar efetivo cumprimento às deliberações desta Corte dentro do prazo fixado em acórdão. Ao contrário, está-se a traçar um planejamento de médio ou longo prazo para substituir o sistema atualmente disponível e cuja operação está contratada pela CMB até 2028.
- E esse intento fica claro quando, na ata, consigna-se que ‘Ministério da Fazenda, em cumprimento à decisão do TCU está criando um novo modelo do Sicobe’, fixando-se os próximos atos do Ministério da Fazenda: publicação de uma nova IN pela RFB; definição de requisitos; diálogo interfederativo com entes subnacionais; diálogo e credenciamento de futuras empresas interessadas; e, por fim, efetiva implementação do novo Sicobe.
- Não ignoro que a Administração deve sempre aprimorar seus sistemas, buscando não apenas a eficiência administrativa, mas também a satisfação das necessidades do Estado e dos administrados. Nada obsta, contudo, que os estudos para a adoção de uma nova solução sejam concomitantes ao religamento e ao funcionamento do sistema atualmente disponível, para o qual há contrato vigente firmado pela CMB.
A justificativa de necessidade de aprimoramento do Sicobe atual não pode servir de subterfúgio para que se descumpram preceitos legais e determinações da Corte de Contas, sobretudo ante o transcurso de lapso temporal suficientemente extenso para o saneamento da questão.
- Destaco que, ao menos desde 2016 (quando da edição dos ADEs 75/2016 e 94/2016), a RFB prega que o atual Sicobe não atende às necessidades da autoridade tributária – o que sempre foi contradito pela CMB.
Além disso, o TC 047.527/2020-0 tramitou por quase de três anos até a primeira decisão de mérito que determinou a religação do atual Sicobe. Não fosse suficiente, após essa primeira decisão de mérito, mais um ano se passou até que os recursos fossem apreciados e a decisão transitasse em julgado.
- Ora, a alegada insuficiência do atual Sicobe e o desprezo pelo art. 35 da Lei 13.097/2015 arrastamse por quase uma década, e, em vez de dar pleno cumprimento às determinações da lei e desta Corte, os órgãos e entidades envolvidos circunscrevem-se à preocupação de pleitear mais prazo, sem que em nenhum momento da reunião tenham sido debatidos aspectos relacionados à efetiva e imediata religação do Sicobe – ou, em outras palavras, ao efetivo e imediato cumprimento do Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário.
- Esse estado de coisas conduz à conclusão de que o ‘revogaço’ promovido pela IN 2.251/2025 – ao extirpar do mundo jurídico todo o arcabouço normativo que dava suporte à operacionalização do atual Sicobe – teve como objetivo imediato viabilizar o planejamento da RFB e da CMB para implementação futura, em data incerta, de uma nova solução, e não o religamento do sistema atual. Repito: não parece estar no objetivo imediato dos jurisdicionados dar pleno e imediato cumprimento à decisão transitada em julgado desta Corte.
- Assim, ante os robustos indícios de que o Ministério da Fazenda, a RFB, a CMB e a PGFN estão delineando estratégias para obstar o cumprimento imediato do Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário, impõe-se a imediata suspensão cautelar dos efeitos do IN 2.251/2025, à exceção da revogação dos ADEs 75/2016 e 94/2016, repristinando-se os efeitos de todos os demais atos revogados.
- Está presente a fumaça do bom direito, pois, de acordo com o conjunto de elementos colhidos na instrução, há fortes indícios de que o ato normativo recém-editado pela RFB foi adotado com a finalidade de inviabilizar ou procrastinar o imediato cumprimento das determinações fixadas no Acórdão 2.144/2023-TCUPlenário, transitado em julgado. Conjugam-se, ainda, elementos que demonstram a aparente ausência de providências concretas e imediatas para assegurar a religação do atual Sicobe, em descumprimento ao que restou definido no referido aresto.
- Quanto ao perigo na demora, restou evidenciado, pela própria revogação de todo o arcabouço normativo que viabilizava a operacionalização do Sicobe, o risco de que a determinação de religar o atual sistema se torne inócua caso a efetivação das medidas necessárias continue a ser postergada. Ademais, a proximidade do término do prazo fixado pelo TCU para a religação do sistema reforça o risco de dano irreparável ou de difícil reparação ao interesse público, justificando, portanto, a imediata concessão da cautelar.
- Importa ressaltar que não se trata de tangenciar o mérito administrativo do ato de revogação promovido pela IN 2.251/2025; trata-se, em verdade, de promover a suspenção cautelar parcial de um ato administrativo editado com fortes indícios de desvio de finalidade, porquanto seu conteúdo conflita frontalmente com as determinações do Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário.
- Diante de tais fatos, a prorrogação de 30 dias concedida por meio do Acórdão 374/2025-TCUPlenário também merece ser revista pelo plenário desta Corte, quando do referendo da presente decisão. É que, em seu pedido de prorrogação (peça 26 do TC 001.021/2025-7), a União solicitou prazo, tão somente, para o atendimento do item 9.2.1 do Acórdão 2144/2023-TCU-Plenário (anulação dos ADEs). Embora a RFB não tenha efetivamente anulado os referidos atos – equívoco que deverá ser revisto e corrigido pelo jurisdicionado –, sua revogação, aliada à suspensão cautelar parcial dos efeitos da IN 2.251/2025 ora promovida, milita em sentido favorável ao cumprimento da integralidade do Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário.
- Reafirmo, uma vez mais, que a RFB e a CMB têm ampla discricionariedade para desenvolver estudos visando à adoção de novo sistema. Não obstante, tal argumento não deve servir para justificar o descumprimento, por quase uma década, de expresso preceito legal, uma vez que os estudos para o futuro aprimoramento do sistema em nada conflitam com a retomada imediata do sistema de controle atualmente disponível.
- Ante o exposto, decido:
- a) conhecer da presente denúncia, satisfeitos os requisitos de admissibilidade previstos nos arts. 234 e 235 do Regimento Interno do TCU (RITCU) e no art. 103, § 1º, da Resolução – TCU
259/2014;
- b) adotar medida cautelar, com fulcro no art. 276 do Regimento Interno do TCU (RITCU), para suspender os efeitos da Instrução Normativa RFB nº 2.251, de 13 de fevereiro de 2025, publicada no Diário Oficial da União de 14 de fevereiro de 2025, à exceção da revogação do Ato Declaratório Executivo Cofis nº 75, de 17 de outubro de 2016, e do Ato Declaratório Executivo Cofis nº 94, de 12 de dezembro de 2016, repristinando-se os efeitos dos demais atos;
- c) realizar oitivas do Ministério da Fazenda, da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, da Casa da Moeda do Brasil e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, com amparo no art. 276 c/c o art. 250, inciso V, todos do RITCU, para que, no prazo de 15 (quinze) dias, prestem os esclarecimentos que entenderem pertinentes, bem como apresentem, dentro de suas competências, cronograma razoável para religação do sistema atualmente disponível, medida a se iniciar antes de findo o prazo fixado pelo Tribunal para cumprimento do item 9.2.2 do Acórdão 2144/2023-
TCU-Plenário;
- d) diligenciar a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil e a Casa da Moeda do Brasil para que, no prazo de 15 (quinze) dias, dentro de suas competências, informem o atual estágio de desenvolvimento do novo Sicobe, bem como apresentem cronograma para sua concepção e implementação e efetiva operação;
- e) diligenciar a Casa da Moeda do Brasil para que, no prazo de 15 (quinze) dias, encaminhe cópia do contrato ou instrumento congênere atualmente vigente referente ao Sicobe, bem como informe a situação atual da avença, as medidas até então adotadas para a retomada de sua execução e a existência de eventuais tratativas internas ou junto à contratada visando à sua rescisão;
- f) alertar ao Ministério da Fazenda, à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, à Casa da Moeda do Brasil e à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional que o descumprimento de decisões do Tribunal enseja a aplicação de multa aos responsáveis, sem prejuízo das demais sanções cabíveis, nos termos do art. 54 da Lei Orgânica do TCU e do art. 268 do RITCU;
- g) apensar os presentes autos e o TC 004.029/2025-9 ao TC 001.021/2025-7, nos termos dos arts. 36 e 37 da Resolução-TCU 259/2014;
- h) encaminhar cópia do presente despacho a Ministério da Fazenda, à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, à Casa da Moeda do Brasil e à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional a fim de embasar as respostas às oitivas.”
É o relatório.
VOTO
Cuidam os autos de denúncia, com pedido de medida cautelar, a respeito de possíveis irregularidades ocorridas na Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB) relacionadas à
edição da Instrução Normativa RFB 2.251/2025, que resultou na revogação de atos normativos editados por aquela Secretaria e relacionados ao controle de bebidas no país, em afronta ao
Acórdão 1.633/2024-TCU-Plenário, proferido nos autos do TC 047.527/2020-0.
- Conforme relatado, este Tribunal, no âmbito daquele processo, proferiu o Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário – posteriormente confirmado pelos Acórdãos de Plenário 1.633/2024 e
2.615/2024 –, reconhecendo a ilegalidade dos Atos Declaratórios Executivos Cofis (ADEs) 75/2016 e 94/2016, porquanto, conjuntamente, estes promoveram, de forma genérica, abstrata e
impessoal, desobrigação de utilização de sistema de controle de produção de bebidas (Sicobe), sem definir, em substituição, a de qualquer outro sistema contador de produção, conforme exigido pelo art. 35 da Lei 13.097/2015.
- Em consequência, o Acórdão 2.144/2023-Plenário fixou prazo para que a RFB procedesse à anulação dos citados ADEs, bem como para que, em conjunto com a Casa da Moeda do Brasil
(CMB), adotasse as medidas necessárias ao restabelecimento da utilização do sistema Sicobe em todas as pessoas jurídicas obrigadas pela Lei 13.097/2015; tais determinações são
objeto de monitoramento no âmbito do TC 001.021/2025-7.
- No último mês, por meio de denúncias autuadas no TC 003.526/2025-9 (estes autos) e no TC 004.029/2025-9, foram trazidos ao conhecimento deste relator indícios robustos de que a Receita
Federal, a CMB, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e a Secretaria-Executiva do Ministério da Fazenda (SE-MF) estariam adotando atos contrários ao cumprimento das
determinações carreadas no Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário, cujo trânsito em julgado se deu em 31/1/2025.
- O primeiro ato denunciado – objeto destes autos – foi a edição, pela RFB, da Instrução Normativa (IN) 2.251, de 13 de fevereiro de 2025, que procedeu à revogação de mais de duas centenas
de atos normativos que davam suporte à utilização e à operacionalização do Sicobe pelas pessoas jurídicas obrigadas pela Lei 13.097/2015; destaco que, entre os atos revogados, estão
aqueles cuja anulação fora determinada pelo TCU: ADEs 75/2016 e 94/2016.
- O segundo ato inquinado, objeto do TC 004.029/2025-9, foi a realização de reunião entre os órgãos e a entidade mencionados no item 4 supra, na data de 19/2/2025, oportunidade em que foram debatidas medidas para postergar a data de cumprimento das deliberações desta Corte, a fim de viabilizar a concepção, o desenvolvimento e a implementação de um novo sistema, em data futura e incerta.
- A ata referente ao referido encontro evidencia que, em nenhum momento, os envolvidos debateram medidas para o religamento imediato do sistema disponível – medida determinada por
aquela decisão. Ao contrário, deliberadamente, centraram-se em delinear estratégias não apenas para procrastinar o cumprimento do precitado aresto, mas também para que a CMB procedesse à rescisão unilateral do contrato atualmente vigente para operacionalização do Sicobe.
- A edição da IN RFB 2251/2025, combinada com as deliberações tomadas pela RFB, CMB, PGFN e SE-MF durante a dita reunião, revela evidente desprezo, por parte da autoridade, das
determinações deste Tribunal, porquanto se está a planejar, de forma meticulosa, formas de proceder a um pseudocumprimento do acórdão, mediante a concepção futura de um novo
sistema – o que, evidentemente, não é possível dentro do prazo de 60 dias consignado na deliberação.
- A desídia da RFB em dar cumprimento ao art. 35 da Lei 13.097/2015 é inquestionável. Ao menos desde 2016 (quando foram editados os ADEs 75/2016 e 94/2016), a RFB propala que o sistema atual, Sicobe, não atende às necessidades da autoridade tributária – o que sempre foi contradito pela CMB. Além disso, o TC 047.527/2020-0 tramitou por quase de três anos até a primeira decisão de mérito, que determinou a religação do atual sistema. Após essa decisão, mais um ano se passou até que os recursos fossem apreciados e a decisão transitasse em julgado; houve, portanto, prazo mais do que suficiente para sanear a questão.
- Nesse contexto, configura verdadeiro acinte que, depois de quase uma década sem adotar medidas efetivas e concretas a fim de dar cumprimento ao mandamento legal, os jurisdicionados
dediquem-se a elaborar novas formas de procrastinar a solução – e o pior: em frontal descumprimento ao determinado por esta Corte.
- No despacho cautelar ora submetido a referendo, destaquei que a suspensão dos efeitos da IN RFB 2.251/2025 não tem por objetivo tangenciar o mérito do ato administrativo de revogação
adotado; em vez disso, objetiva-se cessar, de imediato, os efeitos de ato praticado com evidente abuso de poder, uma vez que a finalidade por ele visada se distancia das determinações do Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário. Sobre o assunto, transcrevo excerto do voto complementar proferido pelo ministro Vital do Rêgo na apreciação do pedido de reexame interposto contra a deliberação:
“11. Portanto, não há margem para interpretação na direção de que a RFB pode, ao seu gosto, aniquilar por completo a obrigação de controlar a produção de bebidas,
assegurada a participação da Casa da Moeda do Brasil, expressamente prevista no art. 28 e parágrafos da Lei 11.488/2007, c/c o caput do art. 35 da Lei 13.097/2015.
- Assim, é evidente que as definições infralegais do órgão não podem se sobrepor a outros requisitos previstos na própria legislação, como é o caso das atribuições da Casa
da Moeda do Brasil referentes à operação do sistema, seja ele o Sicobe ou qualquer outro que venha a ser criado em seu lugar.
- Nesse sentido, também não me oponho à proposta do Ministro Benjamin Zymler de recomendar ao Ministério da Fazenda que exerça sua prerrogativa de coordenação ministerial para mediar o conflito entre a Casa da Moeda do Brasil e a Receita Federal do Brasil e dar cumprimento ao disposto no art. 35 da Lei 13.097/2015, mas desde que a decisão recorrida seja mantida. Aliás, a coordenação ministerial almejada pela recomendação independe de qualquer comando desta Corte de Contas e pode ser desempenhada a qualquer tempo, assim como a qualquer tempo novas soluções em substituição ao Sicobe podem ser buscadas.” [grifos adicionados]
- Comungo do entendimento de Sua Excelência de que é desejável que a RFB e os demais órgãos e entidades interessados realizem estudos visando à otimização e modernização do Sicobe. Tal
medida de natureza programática, contudo, em nada conflita com o religamento do sistema atualmente disponível, contratado pela CMB até 2028, de modo a dar pleno cumprimento ao
Acórdão 2.144/2023- TCU-Plenário e à Lei 13.097/2015.
- Ante tais circunstâncias, considero haver fundamento jurídico relevante (fumus boni iuris) para a concessão de medida cautelar. Quanto ao perigo da demora (periculum in mora), entendo que a manutenção dos efeitos da referida IN RFB e a possível rescisão do contrato firmado pela CMB para a operacionalização do Sicobe podem culminar no descumprimento patente e irreversível do dito acórdão. Ademais, como bem salientado pelo Ministro Vital do Rêgo, em seu voto no precitado pedido de reexame, a utilização de sistema de controle não se cinge meramente a questões tributárias, mas tangencia, também, as de saúde pública:
“28. A regulação estatal evidenciada pelas exigências estabelecidas no art. 35 da Lei 13.097/2015 busca permitir uma supervisão eficaz sobre a produção e distribuição de
bebidas, garantindo que estejam em conformidade com as normas de segurança e qualidade.
Além disso, tal controle busca proporcionar uma fonte significativa de receita por meio de tributação, o que difere de uma situação tão somente autodeclatarória por parte dos
produtores.
- Em termos de saúde pública, o controle estatal da produção de bebidas permite a implementação de medidas preventivas, como restrições à publicidade, rotulagem adequada
dos produtos e programas de conscientização sobre os riscos do consumo excessivo. Essas ações visam proteger a população contra os danos associados ao abuso de substâncias,
incluindo problemas de saúde mental e física, violência e acidentes relacionados ao álcool. Assim, o controle estatal da produção de bebidas representa um fator fundamental na
promoção da saúde e no bem-estar geral da sociedade, ao mesmo tempo em que contribui para a arrecadação.”
- Em contrapartida, não vislumbro periculum in mora reverso. O novo sistema, a ser adotado em substituição ao atual, está em fase embrionária de concepção, nem sequer havendo data estimada para seu desenvolvimento ou operacionalização. Ademais, como já ressaltado, a construção de novas soluções ou o aprimoramento das atualmente existentes não podem servir de subterfúgio para o descumprimento das determinações do TCU.
- Ante o exposto, entendo que estão mantidos os requisitos que ensejam a adoção da medida cautelar, além de ausente o perigo da demora reverso.
- Por fim, entendo cabível que esta Corte torne insubsistente o Acórdão 374/2025-TCUPlenário, por meio do qual concedeu prorrogação de prazo, por 30 dias, para que Receita Federal desse
integral cumprimento às determinações do Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário. Em seu pedido de prorrogação (peça 26 do TC 001.021/2025-7), aquele órgão limitou-se a solicitar prazo apenas para cumprimento do subitem 9.1.2 do precitado acórdão – item em que se determinou a anulação dos ADEs 75/2016 e 94/2016 –, nada requerendo em relação ao subitem 9.2.2 do mesmo aresto – determinação para religação do Sicobe no prazo de 60 dias; contudo, o Tribunal, ao deliberar pela concessão de prazo, estendeu a prorrogação também ao subitem 9.2.2, ampliando o prazo para religação do Sicobe de 3/4/2025 para 5/5/2025.
- Embora a RFB não tenha efetivamente anulado os referidos atos – equívoco que deverá ser revisto e corrigido pelo jurisdicionado –, sua revogação, aliada à suspensão cautelar parcial dos efeitos da IN 2.251/2025 ora promovida, milita em sentido favorável ao cumprimento da integralidade do Acórdão 2.144/2023-TCU-Plenário, de modo que o próprio pedido de prorrogação formulado peloórgão não mais faz sentido.
- Ademais, ante as circunstâncias ora narradas, a concessão extra petita de prazo adicional para que a RFB e a CMB procedam à religação do Sicobe afigura-se medida que converge com os atos procrastinatórios evidenciados no presente caso, devendo, portanto, ser imediatamente revista por esta Corte.
- Assim, submeto ao referendo do Plenário a medida cautelar adotada em 14/3/2024 (peça 10), nos termos do art. 276, § 1º, do Regimento Interno do TCU, mantendo-se as determinações,
oitivas e alertas dirigidos à RFB, CBM, PGFN e SE-MF.
Ante o exposto, VOTO no sentido de que o Tribunal adote a minuta de acórdão que ora submeto à apreciação deste Colegiado.
TCU, Sala das Sessões, em 19 de março de 2025.
MINISTRO JHONATAN DE JESUS
Relator
ACÓRDÃO Nº 607/2025 – TCU – Plenário
- Processo TC 003.526/2025-9
- Grupo II – Classe de Assunto: VII – Denúncia.
- Interessada: Identidade preservada (art. 55, caput, da Lei 8.443/1992).
- Entidade: Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB).
- Relator: Ministro Jhonatan de Jesus.
- Representante do Ministério Público: não atuou.
- Unidade Técnica: Unidade de Auditoria Especializada em Orçamento, Tributação e Gestão Fiscal
(AudFiscal).
- Representação legal: Rodolpho Heck Ramazzini (OAB/SP 217.537).
- Acórdão:
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de denúncia, com pedido de medida cautelar, a respeito de possíveis irregularidades ocorridas na Secretaria Especial da Receita Federal do
Brasil (RFB) relacionadas à edição da Instrução Normativa RFB 2.251/2025, que resultou na revogação de atos normativos editados por aquela secretaria e relacionados ao controle de
bebidas no país, em afronta ao Acórdão 1.633/2024-TCU-Plenário, proferido nos autos do TC 047.527/2020-0,
ACORDAM os ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão do Plenário, ante as razões expostas pelo relator, em:
9.1. com fulcro no art. 276, caput e § 1º, do Regimento Interno do TCU, referendar a medida cautelar adotada pelo relator por meio do despacho contido na peça 10 destes autos,
transcrito no relatório que precede este acórdão, bem como as medidas acessórias;
9.2. tornar insubsistente o Acórdão 374/2025-TCU-Plenário;
9.3. apensar estes autos e os do TC 004.029/2025-9 aos do TC 001.021/2025-7;
9.4. informar ao denunciante, à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, à Casa da Moeda do Brasil, à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e à Secretaria-Executiva do Ministério da Fazenda o teor da presente decisão.
- Ata n° 8/2025 – Plenário.
- Data da Sessão: 19/3/2025 – Ordinária.
- Código eletrônico para localização na página do TCU na Internet: AC-0607-08/25-P.
- Especificação do quórum:
13.1. Ministros presentes: Vital do Rêgo (Presidente), Walton Alencar Rodrigues, Benjamin Zymler,
Aroldo Cedraz, Bruno Dantas, Jorge Oliveira, Antonio Anastasia e Jhonatan de Jesus (Relator).
13.2. Ministro-Substituto convocado: Marcos Bemquerer Costa.
13.3. Ministro-Substituto presente: Weder de Oliveira.
(Assinado Eletronicamente)
VITAL DO RÊGO
(Assinado Eletronicamente)
JHONATAN DE JESUS
Presidente Relator
Fui presente:
(Assinado Eletronicamente)
CRISTINA MACHADO DA COSTA E SILVA
Procuradora-Geral